Amigos vivem me convidando para almoçar ou jantar: “Passa aqui que tem feijoada”, “Reuniremos cinco casais para beber e tocar violão”, “Espero vocês em minha chácara!”.
Eu logo raciocino: só eu permaneço em isolamento? Fico duvidando da minha sanidade, achando que sou um idiota e venho exagerando.
De repente, estamos em casa sem sermos avisados de que o mundo inteiro já pisa na rua. Pelo jeito, nos tornaremos os últimos a abandonar a quarentena.
Leandro Karnal discerniu com categoria: enquanto a classe média suporta a monotonia, quem está na pobreza aguenta a fome. Não são tempos iguais para todos.
Há quem queira sair e confraternizar, eu pergunto: comemorar o quê?
Os hospitais e cemitérios superlotados?
São mais de quinze mil mortes no país pelo coronavírus. Muitas dessas vítimas são resultados diretos de nossa alienação.
Assistimos por dia quatro rompimentos da barragem de Brumadinho. E assistimos! Não nos encontramos no meio da lama.
As pessoas unicamente mudam de postura quando a morte puxar pela mão um conhecido ou um parente. Daí levarão para o lado pessoal e entenderão da pior forma a gravidade da situação. Será que apenas é possível enxergar a realidade depois das lágrimas? Não pode ser antes da dor?
Tomar sol, passear, frequentar shopping, ir ao salão, abraçar os familiares não são privações, mas cuidados, absolutamente viáveis e possíveis. Privado é aquele que se vê sem emprego e sem comida na mesa.
Vamos parar de falar bobagem. É uma guerra civil contra uma doença. Tédio não é sobrevivência.