Meu pai era ordeiro, inteligente, gentil e respeitado. Para votar, vestia seu terno, gravata e chapéu de feltro com as abas arcadas. Um cidadão.
Mas, por ocasião daquela eleição, o país era vítima de uma roubalheira infindável. Milhões, bilhões de dólares – e o povo raspando o tacho, esfomeado, sem ocupação. Meu pai se mostrava nervoso, indignado.
No dia da eleição, não fez questão de colocar o terno, a gravata e o chapéu. Achei isso muito estranho. Me chamou e ordenou:
– Filho, vista isso.
Olhei assustado.
– Mas é roupa de palhaço – bradei.
– Sim, o povo não passa de palhaço. Vista! Eu vou vestir esta.
– Mas é roupa de presidiário!
– Sim, é de presidiário. O lugar em que todo político e seus comparsas deveriam estar.
Achei a ideia extravagante. Lá fomos cumprir o nosso dever de cidadão. O pai – presidiário, macacão listrado e numerado. Eu, de palhaço. O político e o povo.
Naquele dia, tive orgulho de meu pai.