terça-feira, 5 de maio de 2020

Gafes em redação - Hilton Görresen

Certa vez, o fiscal de uma instituição de crédito foi atrás de um devedor rural para cobrar uma dívida, cuja garantia era um cavalo. Não encontrou a pessoa. Depois de tomar informações com os vizinhos, concluiu em seu relatório: “Consta que o mutuário fugiu montado na garantia”. 

Assim como essa, existem muitas gafes, não só nas redações do Enem, sobejamente exploradas como argumento de que “o ensino no Brasil é falho”. 

Proverbiais, numa época, as gafes provocadas por fiscais rurais ao redigirem seus relatórios. Percebe-se que algumas acontecem por falta de reconhecimento do receptor da mensagem: o redator mergulha no estilo bacharelesco ou economês, e não se dá conta do rústico leitor que está na outra ponta do processo, a exigir uma mensagem descomplicada. Outras gafes acontecem por falta de bom senso mesmo (ou de cuidadosa revisada nos textos, evitando ambiguidades). 

Num laudo constava o seguinte: “Tendo em vista que o mutuário adquiriu aparelhagem para processar inseminação artificial, e que um dos touros holandeses morreu, sugerimos que fizesse o treinamento de uma pessoa para tal.” Treinar uma pessoa para quê? Para substituir o touro? 

Em outro relatório constava: “Visitamos um açude nos fundos da fazenda e, depois de longos e demorados estudos, constatamos que o mesmo estava vazio.” Eta, capacidade de observação, não é mesmo?

Outro redigiu o seguinte: “Fui atendido na fazenda pela mulher do mutuário. Segundo soube, ninguém quer comprá-la e sim explorá-la”. Pobre senhora! Como está desvalorizada no mercado.

Uma instituição remeteu ao agricultor a seguinte mensagem: “Cumpre-nos informar que seu pleito logrou êxito”. No dia seguinte, o cliente veio à empresa, exaltado, dizendo que nunca havia logrado ninguém, não era pessoa de fazer essas coisas.

Outro que se deu mal foi o fiscal que colocou no relatório: “O cliente faleceu há um mês, porém a viúva continua com o negócio aberto”.
E finalmente: “As garantias permanecem em perfeito estado de abandono...”. 

No tempo em que o inglês ainda não era nossa língua “oficial”, era índice de “status” balbuciar alguma coisa na língua de Shakespeare. Num órgão público, na avaliação dos subordinados, o chefete, para favorecer um protegido, registrou em seu comentário que fulano “conhecia o idioma inglês”. Depois, ficou em dúvida. Aproximou-se do “peixinho”: 
– Fulano, é verdade que você fala inglês?
– Oui, monsieur!
O chefe não teve dúvidas, acrescentou ao comentário: Além disso, ainda fala francês!