"A primeira vez que escutei algo muito ruim, vindo de um médico, sobre o meu corpo, era uma criança pequena. Lembro que ele falou com a minha mãe que eu tinha a bunda muito grande e que isso iria me prejudicar, porque os meus joelhos não iriam aguentar. A minha mente de criança me imaginou adulta, em uma cadeira de rodas, porque as minhas pernas literalmente não aguentariam a bunda. De lá pra cá, ir ao médico é sempre ruim, não importa quanto eu pese. Eu nunca fui magra, mesmo quando malhava três horas por dia. Quando entro em um consultório, sou apenas uma pessoa acima do peso, desleixada, que precisa emagrecer. Quando eu vestia 42 uma endócrina me passou remédio, porque certo era vestir 38. Tentando caber no 38 eu cheguei ao 48. Hoje a médica me falou que, se eu não morrer por atropelamento, como qualquer um pode morrer, vou morrer de câncer ou diabetes. Cada exame que ela via que estava normal, incluindo a minha pressão, dizia: "Que sorte! Mas não vai durar muito! Com certeza isso vai mudar!". Me entregou meia folha de papel com uma dieta ridícula, que tinha como café da manhã 150ml de iogurte desnatado e uma fruta. Não me perguntou a minha história. Não me perguntou se eu queria emagrecer. Não me perguntou se faço exercícios, se sou ativa, o que gosto ou não. Foi categórica, ou emagreço ou morro em breve. E eu só fui tratar uma sinusite. Hoje entendo quem faz a cirurgia bariátrica, sofre com efeitos como queda de cabelo, anemia e etc, mas fala que valeu a pena. Porque quando você deixa de ser gordo você é visto. Você é humano, não apenas um condenado à morte. Essa preocupação com a saúde é uma falácia, porque estão se lixando para a saúde mental de quem está fora dos padrões. Sofra, acabe com a sua saúde mental, tome remédios fortíssimos diariamente, entre em depressão, mas emagreça, pela sua saúde. Só que não. Queridos profissionais de saúde, um paciente gordo e um magro merecem o mesmo respeito. Nossa boca pode falar mais sobre nós que os números da balança ou do jeans. Escutem mais. Enxerguem para além das suas verdades. Somos mais complexos que isso". Texto: Elisama Santos