Tive a sorte de nascer e crescer durante a era do rádio. Criança ainda, passava os dias ouvindo as músicas cantadas por Orlando Silva, Ataulfo Alves, Emilinha Borba, Marlene e outras estrelas da Rádio Nacional, pois em toda casa havia um grande rádio de válvulas ligado diariamente. Antes dos 7 anos de idade, chorei a morte de Francisco Alves, o chamado Rei da Voz. Isso parece exagero, mas nos acostumamos a ouvir repertório de adultos. A valorização de músicas, gostos e costumes dos jovens só passou a existir após o advento do rock’n’roll e dos filmes que marcaram a revolta da juventude.
A Rádio Nacional tinha seus programas de auditório, onde se apresentavam, sob o comando de Paulo Gracindo ou César de Alencar, os cantores consagrados pelo público. Havia uma “disputa” entre as cantoras Emilinha e Marlene, com os respectivos fãs-clubes a se guerrear, como se fossem torcedores de times oponentes. Havia até um caubói brasileiro, antecedente de Beto Carreiro: o cantor Bob Nelson, autor de músicas alegres, como “Meu boi Barnabé”, com o gostoso refrão “ô tiroleiiiiti...”.
Publicações como a “Revista do Rádio” e “Radiolândia” eram especializadas em divulgar os eventos radiofônicos e o cotidiano dos artistas: Fulano ao lado de seus cachorros; Cicrana de avental, fingindo preparar uma feijoada, e assim por diante.
A Rádio Nacional do Rio de Janeiro foi a maior emissora de rádio que o país já teve. Criada em 1930, foi mais tarde incorporada ao governo de Getúlio Vargas; teve então sua potência multiplicada com a importação de modernos equipamentos. Todos os grandes músicos, cantores, apresentadores e humoristas eram contratados da Nacional.
Gostávamos de assistir aos programas humorísticos como “Edifício Balança mas não cai”. Meu pai acompanhava a série radiofônica “Jerônimo, o herói do sertão”. As novidades da década eram as radionovelas, patrocinadas pelos produtos Gessy-Lever ou Colgate-Palmolive, razão por que esse tipo de programa era conhecido nos Estados Unidos por “ópera de sabão”.
As notícias nos vinham através do Repórter Esso (alô, alô, Repórter Esso, alô!), que durante anos estarreceu o país noticiando os grandes acontecimentos em suas edições especiais.
Mas “a coisa fervia” era na época que antecedia o carnaval. Os artistas apresentavam, então, os alegres sambas e marchas, que, de tanto serem ouvidos, já moravam na boca do povo e podiam ser cantados quando chegava a famosa festa de Momo. A era do rádio passou, mas ele continua vivo em nosso cotidiano.