Como as pessoas se comunicarão daqui a algumas décadas? Essa é um pergunta bem difícil de responder quando temos a sensação de que a nossa língua foi sempre a mesma ou que as nossas formas de comunicação não precisam sofrer algum tipo de mudança. Contudo, a verdade é que muitas expressões do nosso cotidiano irão simplesmente desaparecer. Em outros casos, alguns de nossos termos serão alterados em sua forma, conteúdo e sentido.
Do ponto de vista histórico podemos ver que essas mudanças nem sempre são voluntárias, e que acontecem ao sabor de erros de difícil previsão. No caso do termo “cor de burro quando foge”, algumas pessoas acreditam que o termo tem uma significação quase que literal. Afinal de contas, a cor parda que um burro “pega”, após correr léguas e mais léguas por uma estrada de chão, pode lembrar bem aquele tom estranho de um carro, blusa ou cabelo que vemos por aí.
Mesmo sendo plausível, essa explicação nunca foi historicamente comprovada em algum livro de época, carta ou documento formal. De fato, a explicação mais aceitável desse mistério encontra-se na antiga expressão coloquial “corro de burro quando foge”. Registrada pelo gramático Antônio de Castro Lopes (1827 - 1901), o indício leva-nos a crer que o uso equivocado da expressão original acabou dando origem à “cor de burro quando foge”.
Apesar dos termos não terem nexo algum entre si, essa não é a primeira (e talvez nem a última!) que esse tipo de transformação pelo erro acontece. Investigando a origem de outros termos, veremos que a fala não se perpetua ao longo das gerações. Assim como os comportamentos, gostos e hábitos, as expressões populares assumem feições que estão ameaçadas pelo esquecimento ou pela reinvenção de alguém que escuta um dito da forma que bem entende.
Por Rainer Sousa