Passados quase trinta anos da promulgação da Constituição Federal, novamente o parlamento discute a redução da imputabilidade penal dos 18 para os 16 anos de idade. E novamente organizações civis se mobilizam para enfrentar e defender valores humanos historicamente conquistados. Trabalhando há anos no sistema de justiça criminal, já julguei, condenei, absolvi pessoas as mais variadas. Acompanhei algemas sendo colocadas em condenados a caminho da prisão e também já colhi depoimentos de vítimas chorando em desespero, solitárias em sua dor. Não parei por aí. Atravessando a enorme carga de serviço, fui para as ruas e presenciei as carências diárias das pessoas em educação, saúde, moradia, trabalho. E entrei nos presídios deste país, em unidades de SC, MA, MS, PA, PE, RS, apenas para exemplificar. Neles vi, cheirei e senti nas veias o holocausto do cárcere e o extermínio da juventude. Saindo do Brasil, visitei prisões nos EUA, Itália, França e Alemanha e pude comparar o sistema. Vi um Estados Unidos superencarcerador e violento. Observei mafiosos confinados numa Itália que até hoje discute os efeitos da Operação Mãos Limpas. Admirei candelabros sendo construídos por detentos franceses em unidades para longas penas, nas quais se encontravam pessoas condenadas por terrorismo. E junto de cidadãos alemães, dentro de uma penitenciária desfrutei de um jantar de alta gastronomia feito por orgulhosos detentos, aprendizes de cozinheiros. Assim, estudo e penso com frequência sobre como alcançar um mundo não violento. E nunca presenciei fatos ou encontrei argumentos razoáveis a apontar a redução da imputabilidade penal como eficaz para tanto. Nesse ponto, estou acompanhado da ONU, Unicef, Anistia Brasil e tantas outras instituições humanitárias, para quem a efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente é o melhor caminho para retirar o jovem do flagelo do crime no Brasil. Portanto, porque desejo menos vítimas de crimes e porque acredito na humanidade, alerto: a redução da maioridade penal é retrocesso, trará mais violência, mais vítimas, mais insegurança e mais infelicidade. Parlamentares, arquivem esse projeto. A ética e humanismo agradecem. (A Notícia - 20/10/17)