Sou convidado por amigos a participar de um Amigo Secreto. Poderia ser divertido, mas a mensagem na tela soa como um compromisso indesejado. Não por eles, que são divertidos, inteligentes e fazem de nossos encontros sempre momentos interessantes. É que nunca soube lidar muito bem com as festividades e os jogos de Natal e, este ano, tudo isso ficou menos parecido com espiritualidade, o que, a bem da verdade, já sinto há muitos anos, desde que, publicitário, fazia campanhas de Natal para shoppings centers. Digamos que eu tenha visto o Natal por dentro e não gostei. Não acho que tenha a ver com o que um dia me disseram que era. Está certo, shopping não é o melhor lugar do mundo para um comunista, nem para suas ideias de sociedade e consumo.
Em 2018, ano que a discussão política foi a tônica, com indigerível derrota para os seres utópicos como eu, essa época do ano parece ainda mais incabível, não consigo deixar de perceber uma certa hipocrisia em tudo isso, e isso nunca me afetou tanto.
2018 também foi ano de perdas na família. Pessoas jovens com tanto ainda a viver. Morro um pouco a cada dia, ao caminhar pelas ruas em que caminharam, ao ver em fotos os sorrisos que distribuíam sem nem imaginar o quão perto estavam de partir.
Em termos profissionais, porque também é época de fazer balanço, o ano foi bem satisfatório, com momentos marcantes para este escritor que foi alimentado pelo carinho dos leitores e pelos abraços sinceros das crianças. Como dizem, a vida é feita de altos e baixos. Saio dessa gangorra tonto de emoções e também bastante exausto.
Há afazeres ainda, o ano não acabou, mas a sensação já é de moleza, o calor já bate com jeitão de sal e mar. A língua cansada pede descanso, sede de paz, de barulho de gancho de rede, sede de suco de maracujá, que vou colher em breve das ramas que dominam o quintal dos fundos.
O corpo vai relaxando, como se a linha de chegada dessa maratona estivesse ali na frente. Quero o sossego de uma rede, bons livros à disposição, riso e esquecimento. Não quero nos próximos dias discutir seriedades, o que pude lutar, lutei; o que tinha a dizer, disse. Ano que vem volto a gritar, morro de novo, sabe-se lá!
Quanto ao Amigo Secreto, acho que vou mantê-lo secreto. De resto, compartilhar amor a quem vier de braços abertos. (crônica publicada no jornal A Notícia, em 14/12/18)