Existe coisa mais burrinha do que tradutor automático? Está certo chamar o Mickey Mouse de Miguelzinho Camundongo. Mas chamar Vera Fischer de “Vera Pescador” e a famosa Baker Street, refúgio do detetive Sherlock Holmes, de Rua do Padeiro? Não pode ser bom da cabeça. Hoje, cineastas já querem transformar Sherlock em 007 ou em Indiana Jones, em aventuras cheias de efeitos especiais que nem passavam pela cabeça de Conan Doyle. Mas existe outro aparato que não fica muito atrás: o corretor ortográfico. E para ficar bem claro aos que têm receio até de passar perto de um computador, e não confundirem com corretor de imóveis ou corretor da Bolsa de Valores, esclareço que se trata de um aplicativo instalado no editor de texto que aponta, com um traço vermelho embaixo, os termos que ele considera errados ou mesmo indecentes. Deu pra entender? (o desgramado já sublinhou a palavra “deu”). Há muita gente que precisa desesperadamente dele, mas às vezes não se deve levá-lo muito a sério, especialmente quando resolve ser moralista, censurando palavras que estão cotidianamente na boca de todos. Em uma antiga crônica, reproduzi um trecho da saudosa marchinha de carnaval: “oi, trepa no coqueiro, tira coco”. Pois o indigitado corretor queria porque queria que eu mudasse o trecho para “oi, faz amor no coqueiro, tira coco”. Cabecinha suja, não? (foi daí que veio a ideia para essa mal educada crônica). Estou desconfiado que o tal corretor tem a ver com o Joãozinho das anedotas, que acha indecência em tudo que se fala ou escreve. Pra ele (Joãozinho), numa de suas anedotas, até o conjunto de figuras de teste psicológico é um livro de sacanagem. Agora veja: quando redigi “o boiadeiro toca gado para o curral”, o educadinho disse, não, negativo: “o boiadeiro estou defecado para o curral”. E não lhe importa se a frase nem faz sentido. E o pior: em um conto, escrevi; “o sino repica três vezes”. Ele não deixou por menos: “o sino repênis três vezes”. Quando, num trabalho técnico, redigi “o aparelho em questão computa todos os erros”, ele corrigiu para “o aparelho em questão com prostituta todos os erros”. Numa das crônicas, até meio otimista, tasquei: o que abunda não prejudica. Pra quê? Levei tremenda reprimenda (até que rimou!): Alto lá, cronista de meia tigela, escreva “o que a nádega não prejudica”. Seria de lhe perguntar: o que a nádega tem a ver com as calças? Cuidado, leitor, quando for redigir algum texto tire as crianças de perto do corretor ortográfico.
Crônica publicada no jornal "Notícias do Dia", em 04/05/2016.