O resultado é que sou uma mulher que acha que uma palavra enfeita o homem, um ser humano. Da mesma maneira que uma má palavra, para mim, pode enfeá-lo, traí-lo, expô-lo, entregá-lo. Acho que perde aquela pátria cuja língua não é ensinada com a qualidade capaz de instrumentar seus filhos. Seus filhos perdem. Repare: quando alguém que não tem a palavra como aliada, este geralmente não levanta a cabeça quando fala. Fica inseguro, vê-se despreparado e só. E se acha menor do que o outro. Na maioria das vezes não é. Tem um coração mais amoroso do que seu patrão (ou seja lá quem o estiver julgando), é mais honesto do que quem é mais culto que ele naquele instante; mas, por saber arrumar melhor as palavras, o mais “culto“ pode torcer os fatos de tal forma, que o inocente passe a ser o vilão.
Por isso estou de olho nesta nova orientação do MEC pelo livro didático por ele distribuído chamado “Por uma vida melhor”, onde a concordância gramatical é oralmente permitida ao aluno. Não gosto disso, maltrata a língua, não garante seu futuro vivo com sua lógica e sua filosofia. Ninguém está impedido de brincar ao colo da língua-mãe, de cordelizá-la, de fazer dela um rap, uma quadrinha caipira, de torná- la coloquial a seu modo e gosto, pois isso sempre nos esteve garantido pela licença poética. O Brasil vem piorando o ensino da língua.
Há muitos professores que também não sabem como concordar o sujeito e seus complementos e é um tal de “a gente foram” soltos na sala de aula que nem o mestre pode se corrigir. A língua é um patrimônio de um povo. Não herdá-la com seus poderes é tornar-se órfão. É triste ainda o estado do ensino público da língua no país e a exclusão por conteúdo, faz com que, na hora da competição, o pobre desletrado, que fala errado, fique sempre sendo o empregado do rico que estudou em escola boa e sabe exercer bem o seu idioma. É nesta seleção oral que o “analfabeto oral” dança. Nem entende em alguns casos a formulação da pergunta. Que o MEC corrobore com o mal falar na escola eu não concordo mesmo.
É uma lástima haver gente na faculdade exercendo tão mal a própria língua. Este pensamento não nos trará um Brasil de todos, creiam-me. O mesmo sistema que permite “os livro vai ficar nas prateleira” será o mesmo que o reprovará pelo erro que na formação do brasileirinho agora aprova.
Minha empregada, Valéria Falcão, responsável pela ordem doméstica de meu lar há doze anos, foi a um nefrologista (corra para o dicionário quem não sabe) que mal a olhou e foi dizendo com o exame na mão: “É só não comer gordura, pode ir”. Val ficou parada diante dele e disparou: “Estou estarrecida, o senhor mal me olhou, nada me perguntou, portanto não lhe dou crédito e o senhor deveria ser processado por não exercer bem sua profissão.” O homem tremeu. Uma doméstica falando assim? Pois é este o país que sonho. Vi uma placa numa floresta no Zaire: “Enquanto os leões não tiverem seus próprios historiadores, a história continuará sendo uma versão dos caçadores.”