Diz-se que o mês de agosto é um mês difícil. Enumeram-se eventos tristes ou catastróficos que nos dão a impressão de que se trata mesmo de um mês agourento. Lá fora, nesse início de agosto, a paisagem que minha janela emoldura está nublada, casas e árvores esmaecidas pela névoa densa apenas suportam suas lúgubres existências. Noutras paragens deve estar igual, mesmo o hemisfério norte deve passar por um verão modorrento, envolto em cansaços febris e inquietudes trágicas.
No rádio, Chico suplica: “Ó menina vai ver nesse almanaque como é que isso tudo começou. Diz quem é que marcava o tic-tac e a ampulheta do tempo disparou”. Ouço e questiono tudo no mundo. Quem inventou o calendário que meteu um agosto no meio do ano, no meio da gente? Será que a dor do mundo é cíclica e volta todo ano na mesma época? É a numerologia ou a força do nome que faz de agosto o que agosto aparenta ser?
Chico se calou no rádio. Agora é silêncio que se escuta. E no silêncio, recolho o orvalho das últimas perdas. Não ocorreram em agosto, vieram em maio e julho. Agosto não tem nada a ver com isso. Repenso a humanidade, leio-releio um sem-número de teorias e dou conta da sequência de acontecimentos que desencadeam outros. Não há um padrão, não é o calendário que determina as coisas. Cada vez mais acredito que tudo parte de nós e de como nós enxergamos o mundo.
Se em agosto houve, na história, suicídios, início de uma guerra mundial, mortes de personalidades, bombardeios no Rio, também em agosto, os EUA passou a permitir o voto dos negros e o Congresso brasileiro revogou o Ato Institucional no 5, pondo fim a um dos períodos mais obscuros da história do Brasil.
Não, definitivamente não é o mês de agosto o culpado pelas desgraças mundiais, mas as decisões de pessoas ou de grupos de pessoas que usam o livre-arbítrio para fazerem suas escolhas e gerarem consequências. Que há o acaso eu não tenho dúvidas, mas não é tão determinante como se pensa. Nem somos nós joguetes nas mãos do destino. Gosto de acreditar que cabe a mim determinar meus caminhos e, quando isso não é possível, cabe a mim decidir o que fazer diante do ocorrido. Sempre haverá um caminho a seguir, uma decisão a tomar, um renascer possível. E isso pode ou não acontecer em agosto.
Prepare seus patuás, seu terço, sua mandala e tudo que fortaleça sua crença, não por ser agosto, mas por ser a gosto do homem que grande parte das tragédias humanas acontecem.
(Crônica publicada no jornal A Notícia, em 03/08/2018)