Viram-se. Se gostaram. Mistérios do amor. Mas ela, Maria, era casada. Marido brabo, ciumento. Pertencia àquele algoz, o Raimundão, notório farrista e briguento.
José e Maria viviam de olhares furtivos. Na igreja, nos casamentos, nas procissões. Sempre ele estava onde ela estava – discreto, respeitoso, o coração aos pulos. Cada vez mais magro, um cabo de vassoura. Mas, quando a via, os olhos brilhavam. Sabia que ela o amava. Esperava que o tempo arranjasse o destino. Não tinha olhos para outras.
Então, aconteceu. Retornando de uma viagem, compra e venda de cereiais, Raimundão encontrou Maria desviando o curso do rio, na cama com outro, um compadre. Matou-o e surrou-a, despachando-a só com a roupa do corpo. Raimundão sumiu sertão adentro, nas margens do rio Ivaí, onde polícia não botava os pés.
Não era o que José esperava. Mas, enfim, o caminho estava livre. Amava-a. Paixão cega. Ela não o traíra, mas ao marido, o algoz.
Descobriu onde ela estava. Pra diante de Maringá. Nova Esperança, ainda arraial. Foi até lá, confessou seu amor. Abraçaram-se. Choraram. Fizeram juras. José reformou o rancho, com varanda nova, e os sitiantes viram-no em companhia inusitada. Falou-se bem, falou-se mal. Mas eles estavam felizes.
O mundo foi girando, girando. Um dia, ao voltar da cidade, José a surpreendeu na cama com um moço bonito. A desgraça caía-lhe sobre o costado. Não a matou. Com os olhos rasos d’água, mandou-a embora. Voltou a roer os ossos da solidão, sem amigos, sem mulher. Enraivecia-se, coração de fel. Trabalhava como touro pra esquecê-la. Sim, aquela sirigaita.
Uns tinham dó dele. Outros, sádicos, riam, anedotavam. Meses e anos se passaram. As mágoas foram diminuindo, apagando-se igual toco de vela. Ele só via o sorriso dela, o perfume dela. Era pura como o olho d’água, borbulhando. Por que não a buscava? Estava num meretrício em Londrina. Trouxe ela de volta, a feridas curadas. Fizera novas juras. Tudo como antes. Ela ainda era fogosa e pura.
Boatos, fofocas, maledicências queimavam a língua do povo. Mas eles não davam ouvidos. Tinham nascidos um para o outro.
Então, num domingo à tarde, retornou de seu longo exílio Raimundão, muito apessoado, e com palavras doces e dois revólveres brilhando ao sol da tarde, raptou Maria, e lá se foram, escafederam-se na curva da estrada.
José, o solitário, voltou a roer os ossos da solidão.